A cláusula penal é um instrumento de previsão legal inserido nos contratos, com o objetivo de estabelecer, de forma antecipada, a penalidade aplicável em caso de descumprimento. Sua função jurídica é clara: garantir o cumprimento das obrigações pactuadas e compensar a parte prejudicada. No entanto, no contexto das relações de consumo, especialmente em contratos de adesão, seu papel vai além do jurídico — trata-se também de um mecanismo de correção de falhas de mercado, fundamental para a preservação da eficiência contratual.
Com efeito, a legislação civil distingue a cláusula penal compensatória (inadimplemento absoluto) da moratória (atraso no cumprimento). Ambas têm respaldo jurídico, mas quando inseridas em contratos de adesão assumem uma função estratégica: evitar comportamentos oportunistas, como o free rider (carona).
O impasse ocorre quando um consumidor utiliza os benefícios do contrato de forma pontual e oportunista, arcando com custos menores que os demais, mas usufruindo dos mesmos serviços. Sem a cláusula penal, esse comportamento se tornaria atrativo para todos os consumidores, levando a inviabilidade econômica da oferta, com prejuízo não só ao fornecedor, mas principalmente ao consumidor habitual, que utiliza os serviços de forma recorrente e poderia vê-los desaparecer.
Da mesma forma, a falta de uma multa de saída adequada incentivaria comportamentos oportunistas, levando até consumidores de boa-fé a agir da mesma forma. Isso resultaria na inviabilidade do serviço e no desequilíbrio contratual
Portanto, ao contrário de se tratar de uma penalidade abusiva, a cláusula penal, quando estruturada dentro dos parâmetros da proporcionalidade e da boa-fé objetiva, age como ferramenta de equidade econômica, distribuindo de forma equilibrada os custos e benefícios entre os consumidores e preservando a continuidade da oferta dos serviços com qualidade. Assim, a cláusula exerce dupla função, a primeira é a garantia jurídica do cumprimento das obrigações e a segunda é atuar na correção de falhas de mercado que poderiam afetar tanto a eficiência dos serviços ou produtos, quanto a própria sobrevivência do contrato.
É certo que cláusulas desproporcionais podem ser revistas pelo Judiciário, mas essa é a exceção. Em regra, a multa de saída constitui instrumento válido, essencial e eficaz, não só para coibir o descumprimento, mas também para resguardar a confiança nas relações de consumo e impedir que práticas oportunistas causem prejuízos ao conjunto dos consumidores.
Pelo lado do consumidor, a falta de observância da legalidade da cláusula representa não só um ônus abusivo, mas um sentimento de desconfiança e de estar sendo enganado, já para o fornecedor, além da nulidade, a referida penalidade pode ser inserida em uma sequência de judicialização pelos consumidores, com decisões voltadas desde a redução da multa onde a cláusula não perde totalmente sua eficácia, mas evidencia a vulnerabilidade contratual, ao afastamento da aplicabilidade por completo. Na mesma perspectiva, o juízo pode entender pela condenação do fornecedor em danos morais por prática abusiva, pois vedado pelo Código de Defesa do Consumidor.
Quando o assunto é demanda judicial envolvendo contratos e defesa do consumidor, de acordo com estudo realizado e divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça – Justiça em Números 2021 (publicado em 2022, p. 277), foram registrados aproximadamente 3,1 milhões de processos relacionados à responsabilidade do fornecedor e pedidos de indenização por danos morais, além de 4,1 milhões de ações envolvendo obrigações e espécies contratuais, estando no ranking dos assuntos mais demandados pelo poder judiciário.
A má gestão de contratos dessa natureza pode gerar significativos prejuízos à empresa, fragilizando suas relações jurídicas com os consumidores de seus produtos ou serviços, comprometendo o adimplemento das obrigações pactuadas e ampliando o risco de litígios e questionamentos judiciais, que afetam diretamente a segurança contratual.
Portanto, a cláusula penal, quando bem elaborada, representa instrumento legítimo de preservação da segurança jurídica e de estímulo ao adimplemento contratual, servindo de proteção tanto ao fornecedor quanto ao consumidor.
Assim, verifica-se que a cláusula penal, está longe de ser uma simples penalidade contratual, pois o instituto representa verdadeira garantia de equilíbrio econômico-jurídico, protegendo tanto o fornecedor contra práticas abusivas quanto os consumidores habituais contra a desorganização do sistema. Trata-se de medida indispensável à segurança jurídica e à eficiência econômica.
