É possível o consumidor pleitear indenização por danos morais quando gasta seu tempo útil para resolver um problema causado pelo fornecedor.
A Teoria do Desvio Produtivo é uma construção doutrinária desenvolvida principalmente pelo jurista Marcos Dessaune, a partir de meados dos anos 2000, mas com reflexos extremamente atuais, especialmente quando se trata de violações dos direitos consumeristas por empresas aéreas.
No aprofundamento da teoria tem-se como primordial que o tempo é um bem jurídico valioso e finito, nos dias de hoje podemos dizer que o nosso tempo “vale ouro”, e quando o consumidor por muitas vezes é forçado — sobretudo por empresas aéreas — a buscar resoluções de problemas criados pela própria empresa, iniciasse o desgaste pela ineficiência dos serviços que não foram efetivamente prestados.
Situações como cancelamento de voo sem aviso prévio, atrasos, extravio ou dano de bagagens, e overbooking (venda excessiva de assentos) são exemplos típicos. Nessas ocasiões, o consumidor perde um tempo que poderia ser destinado a atividades produtivas, de lazer, descanso ou convívio familiar. Esse tempo desviado constitui, por si só, um dano indenizável.
Nas palavras de Marcos Dessaune:
“O tempo vital do consumidor é um bem jurídico autônomo e valioso, cuja indevida apropriação pelas empresas deve ser objeto de reparação.”
Nesse contexto, a jurisprudência tem reconhecido o desvio produtivo como fundamento válido para a condenação por danos morais.
Como exemplo, destaca-se decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (Apelação Cível n.º 5004848-80.2022.8.13.0342), onde continha matéria relacionada ao assunto, e especificamente o cancelamento do voo e recolocação deste em outro, cujo embarque seria aproximadamente 12 (doze) horas antecipado, além de inclusão de conexão inesperada, contrária ao adquirido, fez com que o juízo conclui se pela configuração do dano moral, tendo em vista a lesão ao tempo, inerente ao direito de personalidade.
Dessa forma, a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor representa um dano concreto. No setor aéreo, em especial, são frequentes os casos em que consumidores enfrentam longas esperas, múltiplos atendimentos ineficazes e falta de assistência adequada, o que compromete seu tempo útil e sua dignidade. Nessas hipóteses, o desvio produtivo configura-se de forma inequívoca, legitimando a responsabilização das companhias por danos morais, com base na falha de prestação dos serviços e inobservância aos direitos basilares do Código de Defesa do Consumidor.
No entanto é necessário ponderar que a aplicação do instituto deve ser realizada com cautela, de modo a evitar a sua banalização no Judiciário, pois embora o reconhecimento do tempo como bem jurídico seja um avanço na tutela da dignidade do consumidor, nem toda situação do cotidiano justifica a reparação por dano moral.
O comprometimento do tempo útil do consumidor e a frustração resultante da falha na prestação do serviço devem ser efetivamente demonstrados, pois a aplicação indiscriminada e generalizada da teoria pode, com o tempo, gerar desequilíbrios nas relações de consumo e incentivar a judicialização excessiva de situações triviais do cotidiano.
As consequências disso seriam, além da sobrecarga da máquina judiciária, com o ajuizamento de ações baseadas em meros aborrecimentos, sem efetiva violação de direitos, a insegurança jurídica para as empresas, que teriam imputação reiterada diante dos casos, respondendo por qualquer falha mínima.
Ainda, isso pode acarretar um efeito indesejado, que é o enfraquecimento da própria teoria, que seria inserida no risco de perda de sua força argumentativa e sua credibilidade perante os tribunais pela invocação em situações irrelevantes.
Sob essa ótica, é possível traçar um paralelo com o instituto dos danos morais. No âmbito processual, observa-se com frequência a formulação de pedidos desse tipo sem respaldo fático ou probatório consistente, o que revela um evidente desvirtuamento de sua finalidade reparatória. Em muitos casos, o instituto acaba sendo utilizado como meio de pressão ou tentativa de enriquecimento indevido nas relações judiciais.
Conclui-se que a aplicação do instituto possui um lado positivo quando se observa o crescente reconhecimento e aplicação da Teoria pelo Poder Judiciário nas demandas em que é suscitada. Contudo, para evitar sua banalização e o uso indiscriminado, é fundamental estabelecer pressupostos mínimos e critérios objetivos que orientem sua aplicação, assegurando a efetiva proteção do consumidor sem comprometer a segurança jurídica do instituto.