Nova sistemática recursal e precedentes vinculantes do Tribunal Superior do Trabalho
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem atuado para buscar racionalizar a sistemática de criação de precedentes trabalhistas e, então, conferir maior segurança jurídica às relações materiais e processuais do trabalho. Isso tem se mostrado de especial relevância desde fins do ano de 2024, com potencial de criar grandes mudanças a partir de então, incluindo o presente ano de 2025 e seguintes.
Em breve resumo, as mudanças ocorridas demonstram adoção pelo C. TST de mecanismos de criação de precedentes que sejam efetivamente vinculantes, e não apenas persuasivos, como é a grande maioria do acervo de suas súmulas e orientações jurisprudenciais. Para isso, incluiu em seu regimento interno o procedimento de “reafirmação de jurisprudência”, que permite rápida conversão dos precedentes persuasivos em vinculantes, mediante sessão virtual, além de ter afetado diversos temas com divergência entre Turmas e Subseção I Especializada em Dissídios Individuais para Incidentes de Recursos Repetitivos (IRR).
Outrossim, o Tribunal atuou para melhor esclarecer os limites de aplicação do CPC/15 ao processo do trabalho, em especial para a irresignação quanto à decisão denegatória de seguimento de Recurso de Revista. Fixou-se ser aplicável ao processo do trabalho o cabimento de agravo interno, quando capítulo da decisão denegatória se fixar por fundamento de “julgamento de recursos repetitivos, de resolução de demandas repetitivas e de assunção de competência”, nos termos dos arts. 1.030, §2º e art. 1.021, todos do CPC, mantendo-se o agravo de instrumento para os demais casos, conforme art. 897, alínea “b”, da CLT.
Diante disso, será ônus da parte impugnar cada capítulo da decisão com o recurso próprio, sob pena de preclusão, o que é uma mudança substancial à sistemática anterior, no qual o único recurso cabível era o agravo de instrumento. Há que se atentar, ainda, que a sistemática adotada pelo C. TST impôs ser irrecorrível a decisão de desprovimento do agravo interno pelo tribunal, nos termos do art. 1º-A, §3º, acrescentados à IN n° 40/16, ao mesmo tempo que eventual abuso ou intuito protelatório da parte poderá ensejar multa sob o valor da causa, nos termos do art. 1.021, §4, do CPC.
As mudanças mencionadas podem ser interpretadas no contexto de multiplicação da recursos distribuídos ao Tribunal Superior do Trabalho, que levaram a enorme acúmulo de acervo para julgamento pelos(as) Ministros(as) e pelos órgãos que o compõem, com notório prejuízo à duração razoável do processo e, portanto, à eficácia do serviço jurisdicional. Nesse contexto, há de se reafirmar que, na sistemática processual e recursal brasileira, o TST não configura uma “terceira instância” recursal, mas sim uma corte vocacionada à pacificação da interpretação das normas trabalhistas, no país.
Nesse sentido, a nova orientação e atuação do TST vem relativamente tardia, em comparação com outras Cortes Superiores, com o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em ensaio recente, CORREA DA VEIGA e ZUCATTI PRITSCH (2024) indicam que o STF, com a adoção sistemática de repercussão geral, conseguiu reduzir sistematicamente o seu acervo de processos, de mais de 150 mil, em 2006, para aproximados 22 mil, em 2022. Do outro lado, o STJ julgou mais de 1.000 temas repetitivos desde a edição da Lei n° 11.672/20078, o que também contribuiu substancialmente para a redução do seu acervo processual, de 368.505 processos (2015) para 268.314 (2021).
Consideradas as vantagens de celeridade processual, uniformização e racionalização jurisprudencial que a adoção dos ritos repetitivos pode trazer, com efeitos diretos potencialmente benéficos em todos os graus de jurisdição, é necessário ponderar o racional de uniformização dos precedentes com eventuais conflitos que podem emergir pelo seu uso indiscriminado em nosso sistema.
Entre os conflitos que podem surgir e os quais devem ser monitorados, estão as eventuais expansões interpretativas, que possam minar considerações sobre elementos específicos e concretos dos casos analisados, ou criar indevidamente normas gerais e abstratas no ordenamento jurídico; eventual engessamento do sistema, com baixa ou ineficaz adesão às técnicas de diferenciação, “distinguishing”, e de superação normativa, “overruling”; as dificuldades de identificação das razões de decidir (ratio decidendi) dos órgãos julgadores, diante da tradição de adesão à conclusão e não à fundamentação, em nosso ordenamento (CASTRO, Jeorge; DE PAULA, Gil; 2020); além de estreitamento desproporcional do acesso das partes às Cortes Superiores, quando necessário para a pacificação da lide e da interpretação normativa.
Belo Horizonte-MG, 22 de julho de 2025.
Luan da Rocha Guerra
OAB MG-215.908
(1) Inclusão do art. 132-A ao Regimento Interno do C. TST.
(2) Mediante a Resolução n° 224 do C. TST, de 25/11/2024, que acrescentou o art. 1º-A à Resolução n° 205/16.
(3) CORREA DA VEIGA, Aloysio; ZUCATTI PRITSCH, César. A cultura de precedentes e o Tribunal Superior do Trabalho. Revista Trabalho, Direito e Justiça, Curitiba-PR, v. 3, n. 1, 2024. DOI: 10.37497/RevistaTDJ.TRT9PR.3.2024.51. Disponível em: https://revista.trt9.jus.br/revista/article/view/51. Acesso em: 21/07/2025.
(4) CASTRO, Jeorge Lucas da Silva; DE PAULA, Gil César Costa. CRÍTICA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS À LUZ DA CIVIL LAW. In: Rev. do Trib. Reg. Trab. 10ª Região, Brasília, v. 24, n. 2, 2020