Quando o assunto é discussão no âmbito judicial de contratos de empreitada firmados entre empresas, especificamente pela má execução ou não execução da obra contratada, o primeiro aspecto relevante para viabilidade de qualquer ação deste nível, é sob o ponto de vista da distribuição do ônus da prova e a análise da responsabilidade pela execução da obra.
Pois nesses casos o ônus da prova assume contornos distintos daqueles presentes nas relações de consumo. A natureza empresarial da contratação afasta a aplicação automática da inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, impondo às partes o dever de demonstração técnica de seus argumentos.
Nesse contexto, a parte que alega o inadimplemento contratual ou a má execução da obra deve comprovar, de forma consistente, a existência do vício ou da inexecução. Embora a prova pericial costume ser o meio mais adequado para aferir falhas técnicas, documentos como fotografias, orçamentos e relatórios técnicos podem servir como elementos indiciários relevantes, especialmente quando coerentes entre si e capazes de demonstrar, ainda que de modo inicial, a irregularidade na execução contratual.
Nesses casos, tais elementos podem fundamentar a inversão do ônus probatório ou justificar a produção de prova técnica sob o crivo do contraditório, garantindo a efetividade da instrução. Isso porque a empresa contratada, em regra, detém maior suporte técnico e acesso às informações essenciais à verificação da conformidade da obra, sendo, portanto, mais apta a comprovar a adequação dos serviços executados.
Tal compreensão reforça a necessidade de uma distribuição dinâmica do ônus da prova, pautada não apenas na literalidade do art. 373 do CPC, mas também na equidade processual e na busca pela verdade real, sobretudo em relações empresariais onde o conhecimento técnico especializado não é igualmente compartilhado entre as partes.
Nessa perspectiva, a demonstração inicial de falhas técnicas, vícios construtivos ou descumprimento contratual pode ser feita por meio de indícios consistentes, como registros fotográficos, orçamentos, comunicações entre as partes e relatórios técnicos, cabendo ao julgador avaliar a suficiência desses elementos para determinar, se necessário, a complementação da instrução por prova pericial.
Julgados em ações judiciais que versam sobre o tema, tem reafirmado essa diretriz, reconhecendo que, em contratos empresariais de empreitada, a prova técnica possui papel central na elucidação de controvérsias, sobretudo quando há divergência quanto à execução das obrigações contratuais. Todavia, não se pode afastar a relevância de outros meios de prova, que, quando harmônicos e coerentes, podem sustentar a convicção judicial acerca da falha ou inexecução da obra, ainda que subsidiem posterior complementação pericial.
De forma convergente, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, na Apelação Cível nº 1.0000.00.163074-2/000, reconheceu a responsabilidade da empresa executora pela má execução da obra após perícia conclusiva em um caso de discussão de queda de muro executado pela empresa, ressaltando que “a responsabilidade pela queda parcial do muro decorre da má execução da obra, conforme demonstrado pelo laudo pericial elaborado sob o crivo do contraditório”.
Esses precedentes demonstram que, embora a perícia constitua meio técnico para a verificação de falhas construtivas, ela não deve ser encarada como o único instrumento probatório capaz de comprovar a má execução ou o inadimplemento contratual. Sua conclusão, aliás, depende diretamente da qualidade e da coerência das provas pré-constituídas, tais como registros fotográficos, comunicações formais, orçamentos comparativos e relatórios elaborados por profissionais habilitados.
Nos contratos empresariais, em que se presume maior paridade técnica e econômica entre as partes, o ônus da prova tende a ser aplicado com rigor, cabendo à parte interessada demonstrar, de forma consistente, por meio de documentação e elementos técnicos, o descumprimento contratual alegado.
Assim, no surgimento das controvérsias no âmbito judicial, é comum observar-se uma tendência jurisprudencial de atribuir à prova pericial um caráter quase absoluto, como se fosse o único meio hábil a comprovar vícios construtivos ou inadimplementos contratuais. Entretanto, tal postura revela certo formalismo excessivo, que nem sempre se coaduna com a realidade dos contratos empresariais.
Em verdade, a prova documental robusta, composta por relatórios técnicos, registros fotográficos, comunicações contratuais e orçamentos comparativos, pode, em muitos casos, dispensar ou mitigar a necessidade de perícia judicial, sobretudo quando evidencia, de forma clara e objetiva, a falha na execução ou o descumprimento das obrigações pactuadas.
Portanto, uma interpretação mais equilibrada e contemporânea do ônus probatório, que reconheça a força e a suficiência da prova documental em determinados contextos empresariais, reservando à perícia um papel de confirmação técnica e não de exclusividade probatória. Essa visão, embora ainda minoritária, dialoga com os princípios da celeridade e da economia processual, e fortalece a efetividade da justiça empresarial, evitando que o processo se transforme em um entrave meramente formal para a solução de litígios técnicos, que muitas vezes já foram comprovados ao longo da lide por meio de provas produzidas pelas partes.
